quinta-feira, 23 de setembro de 2010

MEL REDI - " O MENINO E O RIO "


O MENINO E O RIO

Maria Emília L. M. Redi

O menino sentou-se à beira do rio. Deixou o olhar perdido nas águas inquietas... As correntezas levaram o tempo e todos os sonhos. E já não era mais o menino.

Era o ancião, habitante do seu íntimo, martelando os pregos da canoa, que o levaria à outra margem.

Lá, encontrou o filósofo, perdido em sua complicada e sensível realidade. Deslizou os passos pelas idéias, que permeiam a essência do Ser, e sentiu-se rico, ao constatar-se imprimido na unidade. Pensou, - Sou um rio! E mergulhou nas profundezas da eternidade...

Viu-se em todas as eras. Sentiu em cada célula, em cada átomo o latejar da evolução sem fim das espécies. Percebeu outros seres vivenciando as mesmas dores, as mesmas alegrias e encontrou semelhanças entre os paradoxos.

Sorriu, feliz, apreciando a chuva.

As campinas verdejaram e o sol inundou de calor as vidas. As plantas floresceram e vieram os frutos, que amadureceram, caíram ao chão e apodreceram.

No espelho d´água avistou a criança e o velho, e... aceitou as limitações do seu entendimento.

Admirado, estendeu o olhar pela mata em chamas e viu o homem destruindo o paraíso. - Era o homem o predador das espécies... - Era ele mesmo! E chorou todas as lágrimas do remorso.

Outras estações vieram. Ele cantou na voz do vento todas as épocas. Sentiu-se só, diante da natureza destruída e dos animais carbonizados.

O mormaço daquela atmosfera era escaldante!

A deusa Ganância, tão despótica e insensível, lançou-lhe um bafo quente, cheirando a enxofre.

- Seria o caos?

Sentiu sede, mas as águas já não eram cristalinas e potáveis.

- Onde estaria o rio? Aquele da sua infância? Onde estaria?

Remexendo as cinzas do passado, imaginou-se a “Fênix” , como num passe de mágica, delas faria renascer o paraíso. Cerrou forte os olhos e desejou ardentemente:

- VERDE! VIDA!

No palco da existência, abriram-se as acinzentadas cortinas de fumaça.

- Era azul, muito azul o céu deste momento!

E o verde vibrou nos olhos da Vida!

O paraíso se expandiu como miragem dos seus sonhos...

Na Terra, na Criação, na criança, no ancião, os corações pulsavam em uníssono:

- Há Esperança! Não é tarde demais para o recomeço.

A Vida ofereceu ao mundo outra chance. E, sentado à beira do rio, era, novamente, o menino que acreditava em um mundo melhor para a criança, o ancião e toda Criação.

Soltou das mãos as pesadas correntes do desamor... E as águas do perdão as levaram embora.

Pousou os pés no chão da realidade e sentiu firmeza

- Agora é um novo tempo!!!

As águas do rio rolaram, rolaram... O menino cresceu.

O ancião, em sua dimensão, sorriu... à espera de um possível reencontro, muito diferente, muito mais cósmico, pós o caos.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

MEL REDI - " TORMENTA "


TORMENTA


Sob o céu de Vila Nova,

Gaivotas revoam livres

Por sobre caves antigas

Onde vinhos envelhecidos

Tingem-se de saudade...



Na alma viajante

Tinto néctar embriaga

"Antiga Ilusão" ...

Sempre tão nova !



Sonho louco...

Um bem querer,

Uma paixão que nunca morre !



Através da janela d’alma

Brota um rio salgado

A escorrer pelo Douro

Todo o lamento

Do velho fado desaguado

No revolto mar do meu tormento!!!


Mel Redi